Santuário da Muxima: uma pintura de Isabel Nunes


O Santuário da Muxima é uma das pequenas e preciosas igrejas seiscentistas erigidas ao longo do rio Cuanza.

O culto a Nossa Senhora da Conceição de Muxima tem raízes históricas, associado aos males sociais que afectaram a população, como a escravatura - Muxima constituiu durante muito tempo um importante centro de passagem de escravos vindos do interior e enviados depois para a América.

Nos últimos séculos, a devoção popular aumentou particularmente quando as zonas do Cuanza foram gravemente devastadas por fomes e epidemias que dizimaram populações inteiras.

Nossa Senhora da Conceição de Muxima constitui uma das mais veneradas invocações em todo o continente africano. Coração da devoção mariana em Angola, milhares de peregrinos acorrem anualmente de todos os pontos do país, percorrendo quilómetros durante longos dias, de modo a fazer chegar as suas preces a Mamã Muxima, como é carinhosamente invocada.

Está prevista a construção de uma nova Basílica da Muxima, cuja maquette foi apresentada ao Papa Bento XVI quando visitou as terras angolanas em 2009. O Santo Padre expressou nesses dias o voto de que Seja a Senhora da Muxima a estrela da vossa vida, que vos guarde unidos na grande família de Deus.

 

A Exposição Angola crer, imagens de uma aventura

O notável painel foi realizado no âmbito da Exposição Angola crer, imagens de uma aventura, promovida pela APCD (Associação Portuguesa de Cultura e Desenvolvimento) em parceria com a ACDA (Associação de Cultura e Desenvolvimento de Angola), a convite da CEAST – Conferência Episcopal de Angola e São Tomé -, a propósito do Ano da Fé e no contexto da evangelização.

A exposição foi realizada no Memorial Dr. Agostinho Neto, em Luanda, e inaugurada no dia 24 de Outubro de 2013, por D. José Imbamba, Arcebispo de Saurimo e Presidente da Comissão de Cultura da CEAST. Estiveram presentes a Ministra da Cultura da República de Angola, o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas, o Reitor da Universidade Católica e outras personalidades eclesiásticas, civis e militares. A exposição esteve patente ao público durante os meses de Novembro e Dezembro.

A exposição constou de um conjunto de cerca de cem peças da pintora Isabel Nunes, do qual fez parte um grande políptico dedicado ao Santuário da Muxima.

 

O painel Mamã Muxima, o percurso*

O políptico é composto por quatro grandes telas, as centrais de maior dimensão.

Segundo a memória descritiva da pintura, o tema base é Nossa Senhora da Conceição de Muxima  e a peregrinação e devoção de que é alvo por centenas de milhares de peregrinos que anualmente se deslocam ao Seu santuário.

A motivação da artista foi sustentada por duas vertentes fundamentais, ambas de igual importância e peso: Nossa Senhora da Conceição de Muxima, conhecida tradicionalmente por Mamã Muxima, enquanto símbolo religioso e cultural muito importante e abrangente em toda a Angola; e o tema da Mamã Muxima que traduz a alma católica angolana, sendo ao mesmo tempo uma imagem representativa da cultura angolana, e que faz dela um ícone de veneração único e particular em África.

O título exprime a Mamã Muxima representada em procissão e em festa e o subtítulo pretendeu evidenciar o caminho na sua dimensão terrena e espiritual percorrido pelos peregrinos, quer a sua longa, por vezes tão árdua e de tão longe, até ao santuário,  quer significando o caminho da Fé e da devoção de todos os cristãos angolanos. 

O primeiro painel, do lado esquerdo, apresenta de uma forma sintética e memorial, a torre da velha igreja da Muxima. A sua representação pretende recordar a história na origem do culto prestado a Nossa Senhora em Muxima, ao mesmo tempo que representa também o local tradicional para onde convergem anualmente, em peregrinação, centenas de milhar de angolanos, sendo sem dúvida uma tradição da Angola católica com grande carga cultural.

 O segundo painel, integrando a parte central e nuclear do políptico, contendo um conjunto de figuras anónimas que caminha, representa o percurso terreno, humano e simultaneamente densamente espiritual e cultural dos peregrinos.

As longas caminhadas percorridas por aqueles que, em grupo, se dirigem ao santuário, formando  longos e grossos cordões humanos, carregando as suas oferendas. 

O terceiro painel, o apogeu, o momento da procissão, onde é dado destaque à imagem veneranda de Nossa Senhora de Muxima. Sobre uma superfície texturada, predominantemente laranja e ocre, que representa a multidão interminável de peregrinos presentes com os seus archotes, sobressai e impõe-se a imagem 'iluminada' da Mamã Muxima, que se agiganta em toda a sua dimensão espiritual e protectora.

É o culminar da comunhão entre o homem e a fé, o encontro do terreno com o espiritual, onde os peregrinos recebem a luz emanada pela fé na Mamã Muxima, ao mesmo tempo que a luz dos seus archotes iluminam e seguem a Sua imagem, captando um percurso predominantemente espiritual.

O quarto painel, que fecha do lado direito o políptico, alude ao futuro e, nele, a representação esquemática da basílica que vai ser construída em Muxima, cuja vista superior nos transporta aos símbolos divinos da comunhão, simbolizando a Fé, a projeção da Fé, e a expansão do cristianismo. 

As telas são de grande dimensão, as centrais de 1,90 x 1,00m e as laterais de 1,90 x 0,50m, pintura em acrílico, com técnica mista.

 

A pintora Isabel Nunes: uma nota biográfica

Isabel Nunes nasceu em Cascais, Portugal, tendo-se dedicado como artista plástica a temas da historiografia portuguesa, com uma experiência adquirida nomeadamente em Macau, onde viveu alguns anos e onde adquiriu grande parte da sua especial sensibilidade para temas da herança cultural portuguesa.

A sua particular participação na Exposição Angola crer, imagens de uma aventura, evidenciou a vertente cultural e a dimensão universal dos seus temas, nomeadamente os painéis sobre o Santuário da Muxima. Foi o culminar de uma vivência pessoal, segundo as suas próprias palavras, tocada pela doçura maternal da mulher angolana, que tão bem traduz a maternidade de Nossa Senhora e o seu culto. A expressão no rosto da figura que domina a tela, comporta o sacrifício e a fé, sacrifício e fé comum a todas as mulheres e homens peregrinos que fazem a sua caminhada, por vezes de tão longe.

 

*O Painel “Mamã Muxima, o percurso” encontra-se actualmente em Lisboa, sendo um dos poucos ainda em vias de ser adquirido. Para mais informações contactar explorando.o.patrimonio@gmail.com.

 

Fotos: amavelmente cedidas pela pintora Isabel Nunes

Colaboração: ACDA – Associação de Cultura e Desenvolvimento de Angola

 

REFERÊNCIAS

  • Associação Portuguesa de Cultura e Desenvolvimento, Crer, Imagens de uma Aventura, Lisboa, Paulus Editora, 2012, Suplemento 2013.



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Comentários

Nazaré Escobar
3 meses atrás

Parabéns à Pintora Isabel Nunes e aos autores do texto.



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