
Igreja Da Graça, Santarém
Nesta página:
I . História
II . Descrição
III . Os Agostinhos em Santarém
I . HISTÓRIA
Em 16 de Abril de 1380 foi lançada a primeira pedra da capela-mor da igreja do Convento de Santo Agostinho de Santarém, situado dentro do amuralhado da cidade.
As obras iniciaram-se com o patrocínio dos Condes de Ourém, D. João Afonso Teles de Meneses († 1381) e sua mulher D. Guiomar Vilalobos (c. 1321-1404).
D. João Affonso Tello de Menezes, Conde de Ourem, e sua Mulher D. Guiomar de Villalobos, bisneta de D. Sancho de Castella, por devoção especial a S. Agostinho quizerão ter na Villa de Santarem, seu domicílio, hum Convento de Frades seus, e da invocação do mesmo Santo. (1)
A construção da igreja começou presumivelmente pela capela-mor, como era habitual, sendo a fachada principal a última ser edificada.
A construção foi demorada, pelas vicissitudes da família Teles de Meneses, e realizada em várias fases, provavelmente com Mestres das obras contemporâneas do Mosteiro da Batalha.
Entre 1408 e 1412, foi prior do convento agostinho São Gonçalo de Lagos e no seu tempo, se acabou de aperfeiçoar o edifício deste Convento com os rendimentos da nova herdade da Ocharia, de que o Santo Prior tomou posse no ano seguinte de 1409 (2). Em 1412, o Convento tinha prosperado a ponto de ser considerado um dos mais ricos da sua Ordem em Portugal.
No primeiro quartel do século XV, terminaram as obras de construção, mas a campanha artística prosseguiu nos séculos seguintes. A igreja, dedicada a Santa Maria da Graça – invocação particular na Ordem dos Agostinhos - foi-se tornando no panteão dos descendentes dos primeiros patronos.
Em 1437, D. Pedro de Meneses (1370-1437), 1º governador de Ceuta e neto do fundador, foi sepultado numa das capelas da igreja, em túmulo mandado edificar por sua filha D. Leonor de Meneses (c. 1413-1452).
D. Isabel de Castro (1473-1538), mulher de Pedro Álvares Cabral (c. 1468 – c. 1520), também descendente da família Teles de Meneses, fez abrir sepultura num dos absidíolos junto à capela-mor, para onde fez trasladar o corpo do grande descobridor do Brasil.
Em 1531, D. Mécia Mendes de Aguiar (c. 1466- c.1532), mulher de Gonçalo Gil Barbosa († 1509), o primeiro feitor de Cochim, mandou edificar a Capela do Senhor Jesus, onde foram sepultados os seus familiares.
Em meados do século XVI, a nave da abóbada desmoronou-se, possivelmente ainda por efeito do grande sismo de 1531. D. João III (1502-1557) mandou reedificar uma nova abóbada com tecto de madeira bem lavrada toda pintada (…) com as Armas do Reino (3).
Em 1594, D. Gil Eanes da Costa († 1612),governador de Ceuta e notável presidente do Senado da Câmara de Lisboa, e sua mulher D. Margarida de Noronha mandaram construir uma grande capela privativa, dedicada a São Nicolau de Tolentino, grande santo da ordem agostiniana. Foram contratados os mestres Pedro Nunes Tinoco (c. 1565-1640) e Diogo Teixeira (c. 1540 – c. 1612) para a realização do magnífico retábulo, retirado nos meados do século XX. A capela foi sede da Irmandade das Almas erecta em 1606.
No convento, acrescentou-se um terceiro piso, e foi construído um novo claustro pelo mestre António Dias (c. 1597).
Ao longo dos séculos XVII e XVIII, a igreja foi sendo continuamente enriquecida, nomeadamente a colocação do original relógio na torre da igreja, a construção do coro-alto, a colocação de altares de talha e o azulejamento de várias capelas, entre as quais a Capela de Santa Rita - descrita pelo Padre Inácio da Piedade e Vasconcelos, cronista escalabitano, na História de Santarém Edificada (1740).
O terramoto de 1755 provocou estragos nas estruturas. Segundo as Memórias Paroquiais (…) cahiram as abóbadas de Santa Rita, e de S. Nicolao de Tolentino. Os telhados, paredes da Igreja e todo o Convento padeceo ruína.
As perturbações da primeira metade do século XIX, nomeadamente a terceira invasão francesa (1810-1811), as guerras liberais (1832-1834), e o doloroso processo de exclaustração dos conventos, tiveram efeitos particularmente funestos no património da cidade de Santarém. Em 1829, foram transferidos os presos da cadeia para as instalações do edifício monacal, depois retirados a pedido dos religiosos. A extinção das ordens religiosas, pelo decreto de 1834, provocou a depauperação da igreja - que foi secularizada - e do convento, muito rico em bens imóveis. Muitas obras foram destruídas ou dispersas, incluindo a valiosa Livraria.
O convento foi fechado, tendo em 1837 sido ocupado brevemente pelo Hospital. Foi comprado pelo comendador Silvério Alves da Cunha, que o transformou em casa de residência. Em 1849, por legado do proprietário foi doado a um recolhimento destinado a órfãs – o futuro Asilo de Santo António. Em 1890, foram demolidas algumas partes do edifício monacal, subsistindo apenas algumas estruturas, nomeadamente o claustro quinhentista.
Em 1910, a igreja da Graça de Santarém foi classificada como Monumento Nacional.
Durante a década de 1940-1950, o templo, bastante arruinado, teve uma grande campanha de obras promovida pela Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais. Foi realizado um profundo restauro destinado a repor a originalidade primitiva da notável igreja gótica: restabelecer o aspecto geral que outrora enobrecia o antigo santuário dos gracianos de Santarém (4). Foram desmontados e retirados os altares de talha, os painéis de azulejo - nomeadamente os painéis de Santa Rita -, o grande retábulo de São Nicolau Tolentino, alguns recolocados noutras igrejas do distrito.
Entre finais do século XIX e começos do Século XX, intensificou-se o interesse pelo valioso património religioso, histórico e artístico da igreja da Graça de Santarém; e, ultimamente, também o empenho pelo restauro dos painéis azulejares e das antigas pinturas, a procura do património disperso e, de modo particular, a pesquisa das relações entre esta igreja e o descobridor do Brasil.
II . DESCRIÇÃO: PASSOS DE UMA VISITA
A igreja da Graça está situada num amplo largo (1), onde se destaca a estátua de Pedro Álvares Cabral, de Domingos Soares Branco (1925-2013), e a Casa do Brasil, instituída no antigo solar da família do descobridor das terras de Vera Cruz.
Na fachada principal (2), destaca-se o elegante pórtico gótico, com arquivoltas em arco quebrado e alfiz na parte superior, sobre painel de pedraria trabalhado. Tem lateralmente o escudo de armas de D. João Afonso Teles de Meneses, patrocinador do convento, com a heráldica primitiva dos Meneses. A admirável rosácea, muito semelhante à do Mosteiro da Batalha, esculpida numa só pedra calcária, é possivelmente uma das mais originais do gótico flamejante.
Do lado direito, ergue-se o edifício do antigo convento de Santo Agostinho (3) – também designado por Convento da Graça de Santarém. No portal da antiga portaria é visível a data de 1673 – correspondente à campanha de obras do final do século XVII.
Mantém a antiga torre, restaurada nos meados do século XX, e de onde se retirou o admirável mostrador de relógio possivelmente dos finais do século XVI - actualmente no Museu Municipal de Santarém instalado na antiga igreja de São João do Alporão.
A tríplice cabeceira no exterior indicia de alguma forma o admirável interior.
A igreja fica abaixo do pavimento da rua, por onde se abre o portal, dado o declive do terreno. Acede-se ao magnífico interior (4) por escadaria descendente, que amplia a impressão de elevação do templo.
A iluminação é feita pelas rosáceas e frestas trilobadas da nave e das capelas absidais.
Tem três naves amplas, divididas por grandes pilares cruciformes com capiteis com figuras esculpidas: parras, folhas de cardo, máscaras humanas, cabeças simiescas, dois anjos segurando escudo heráldico…
À entrada do templo do lado direito encontra-se o arcossólio com túmulo armoriado da família Portocarreiro (5), tendo no pavimento lápide sepulcral armoriada de D. Isabel de Vilalobos; e do lado esquerdo a arca tumular também armoriada de Simão Vaz de Gamboa (6), cavaleiro da Ordem de Santiago, em arcossólio com vestígios de pintura mural (século XV).
Uma outra escadaria do antigo claustro está enquadrada por portal restaurado na década de 40/50 do século XX.
A capela do Senhor Jesus dos Passos (7), mandada edificar em 1531 por D. Mécia Mendes de Aguiar, teve alterações na primeira metade do século XVIII, provavelmente com o azulejamento mural. Tem acesso por um arco trilobado com escudo esquartelado das famílias Barbosa e Portocarreiro.
O grande painel de azulejos, na parede de fundo, representa São João Baptista com Santo Agostinho (?) e Santa Rita de Cássia.
Preside a imagem do Senhor dos Passos, de grande veneração na temática graciana - associada à antiga Irmandade dos Passos sedeada nesta capela – sobre suporte com painel de azulejos. Junto encontra-se uma imagem de Nossa Senhora das Dores.
Na parede direita, encontra-se a arca tumular de Pero Rodrigues Portocarreiro e do seu genro Gonçalo Gil Barbosa, mandada edificar por D. Mécia Mendes de Aguiar cerca de vinte anos após a morte de seu marido: Aquy jaz ho muito homrado pero roiz porto carreiro ayo que foy do conde dom anrique cavaleiro da hordem de samtiaguo he ho muito homrado gonçalo gil barbosaa seu jenro caualeiro da hordem de cristo he asi ho muy homrado seu filho francisco barbosa os quaes foram trasladados a esta sepultura no ano de 1532. O admirável arcossólio, decorado, tem escudo da família Portocarreiro no remate entre dois bustos ao estilo clássico.
Na parede do lado esquerdo encontra-se um escudo encimado por elmo, de composição semelhante ao do arco da entrada.
No largo transepto, encontra-se do lado direito, a antiga capela de Santa Rita de Cássia (8), desprovida, durante o restauro dos anos 50 do século passado, dos grandes painéis de azulejo do século XVIII.
Destaca-se o admirável túmulo de D. Pedro de Meneses. É um túmulo duplo com os jacentes ricamente vestidos, D. Pedro com armadura, escudo e espada, D. Beatriz Coutinho – também identificada como sendo D. Margarida Sarmento de Miranda, primeira mulher - com túnica e capa, segurando o Livro de horas. A grande arca tumular em calcário está profusamente decorada com ramos de zambujeiro envolvendo a famosa divisa ALEO – do governador de Ceuta -, anjos e querubins, carrancas e cordas floridas. Está assente em oito grandes leões. Sobressai a grande profusão heráldica: o brasão de D. Pedro de Meneses nas diversas faces da arca, além do que figura no jacente, os brasões de D. Margarida Sarmento de Miranda e de D. Beatriz Coutinho. Tem uma longa legenda epigráfica em caracteres góticos.
Nesta capela, junto ao túmulo, encontra-se também a lápide sepulcral armoriada de D. Leonor de Meneses, filha de D. Pedro, executora do testamento de seu pai e que empreendeu o restabelecimento do panteão familiar, nomeadamente a edificação do magnífico túmulo.
No topo esquerdo, encontra-se a antiga Capela de São Nicolau Tolentino (9), mandada construir em 1594 por D. Gil Eanes da Costa e sua mulher D. Margarida de Noronha. Tinha anteriormente um admirável retábulo da autoria de Pedro Nunes Tinoco e pintura de Diogo Teixeira, representando a Visão Mística de São Nicolau Tolentino, actualmente na Igreja do Hospital da Misericórdia de Santarém. A capela, anteriormente coberta de azulejos, foi desmantelada também durante os restauros dos anos cinquenta do século XX.
Actualmente persiste a lápide encastrada e encimada por um notável escudo com as armas dos Costas, alusiva à fundação, com inscrição:
ESTA CAPELLA HE DE DOM GIL EANES DA COSTA DO CONSELHO DE ESTADO DOS REIS DOM PHELIPPE SEGUNDO E TERCEIRO DESTE NOME E SEV GOVERNADOR E CAPITÃO DA CIDADE DE CEPTAE PRESIDENTE DA CAMARA DA CIDADE DE LISBOA NO TEMPO EN QVE NEILLA OVVE GRANDE PESTE E A GOVERNOV COM MERO E MISTO IMPERIO SEM NVNQVA DELLA SE SAIR E DEPOIS PRESIDENTE DO DESEMBARGO DO PAÇO QVATRO ANNOS E DE DONA MARGARIDA DE NORONHA SVA VNICA MOLLHER E DE SEVS HERDEIROS AMBOS A DOTARÃO PERA NELLA SE LHE DIZER MISSA A QVOTIDIANA E OFFICIO DE NOVE LICÕES EN CADA HU ANNO FALECEO NA ERA DE (…) E SEIS DE MAIIO
A admirável cabeceira da igreja tem capelas poligonais, com portas de comunicação, abóbadas nervadas e frestas de iluminação.
Na capela-mor (10), encontra-se o túmulo dos patrocinadores da Igreja e Convento de Santo Agostinho – D. João Afonso Telo de Menezes e sua mulher D. Guiomar Vilalobos, com lápide armoriada e inscrição:
AQVI IAZ HO M NOBRE E VERTVOSO SNOR DOM IOHAM AFONSO TELO DE MENESES CONDE DOVREM E A MUITO NOBRE E VERTVOSA SNORA CONDESA DONA GVIOMAR DE VILALOBOS BISNETA DEL REI DÕ SÃCHO DE CASTELA SVA MOLHER OS QVIS EDIFICARÃO E DOTARÃO ESTE CONVENTO.
O altar-mor, que não corresponde ao primitivo, está ladeado pelas imagens de Santo Agostinho e, possivelmente, de Santa Rita de Cássia, santos de veneração agostiniana.
Na ombreira do arco encontra-se um letreiro alusivo à fundação do convento: Este convento mandou fazer o Conde d’Ourem D. João Affonso e a Condeça D. Guiomar sua Mulher, e foi posta em el a primeira pedra 2ª feira 16 d’Abril da Era de 1418 / 1380 de Christo.
Do lado direito, encontra-se a capela onde jaz Pedro Álvares Cabral (11), o notável descobridor do Brasil, e sua mulher D. Isabel de Castro, em sepultura rasa com epitáfio:
Aquy Jaz pero alvarez cabral e dona Isabel de Castro sua molher cuja he esta Capella he de todos seos herdeyros aquall depois da morte de seu marido foy camareyra mor da Infanta dona Marya fylha del Rey dõ João noso sñor ho terceyro deste nome
No absidíolo esquerdo (12), destaca-se o túmulo de Afonso de Vasconcelos – também de ascendência dos Meneses - e sua mulher D. Isabel da Silva, com arco conopial e arca tumular suportada por leões, com brasões dos sepultados e extensa inscrição em caracteres góticos.
A lápide na parede esquerda remete também para a sepultura de D. João Luís de Meneses e Vasconcelos e D. Maria de Castro; está sobrepujada de escudo com as armas reais e inscrição:
NA SA (sepultura) DO TVMVLO Q ESTA NO Mº(meio) DESTA CAPELLA ESTA DÕ Iº(João) LVIS DE MS E VASC.os SR D MAFRA Fº DE DÕ ANTº DE MS E VASCos E NETO E ERDro DOS COMDES DE PENELA E QVINTO NETO DO IFANTE DÕ Iº (João) Fº LEGITIMO DEL REI DÕ Pº DE PORTUGAL VIVEO 57 ANNOS E ACABOV A 5 DE DEZ. bro DE 633 E POR MORER NA CORTE DE MADRID MÃDOV TRAZER DE LA O SEV CORPO INTEIRO DONA Ma DE CASTRO SVA MOLHER Q LHE MAÕDOV FAZER ESTAS SA Õ ELA TAÕBEM ESCOLHEO Pa SE SEPVLTAR ANNO DE 1637
No antigo convento de Santo Agostinho (13), com uma história atribulada a partir do século XIX, além dos vestígios na fachada principal, ainda é visível: o claustro quadrangular dos séculos XVI-XVII, do mestre pedreiro António Dias, com cinco arcadas de abóbadas artesoadas; o antigo pórtico de acesso ao convento, com brasão da ordem agostinha – coração atravessado por setas - na parte superior, ladeado pela data 1638, alusiva à campanha de obras do século XVII; e ainda um peculiar sino de bronze numa das fachadas.
III . OS AGOSTINHOS EM SANTARÉM
Os eremitas de Santo Agostinho têm origem na vida monástica comunitária introduzida por Santo Agostinho (354-430) no Norte de África. Na Europa, muitas congregações e irmandades religiosas adoptaram a Regra do grande Santo. Em 1256, na Grande União, foram reunidas numa única ordem Ordo Eremitarum Sancti Augustini (OESA).
Em Portugal, houve possivelmente congregações inspiradas na Regra de Santo Agostinho antes da unificação da Ordem.
No século XII, foi edificado o pequeno convento de São Gens em Lisboa, origem do Convento de Nossa Senhora da Graça. Em 1256, aquando da Grande União, os conventos agostinianos portugueses entretanto fundados ficaram sujeitos à província de Espanha e Portugal. Em 1387 foi criado o vicariato provincial, independente, constituindo o Convento de Nossa Senhora da Graça em Lisboa a casa provincial, motivo pelo qual os religiosos agostinhos são vulgarmente também chamados Gracianos. Em 1447, foi criada a província portuguesa da Ordem dos Eremitas Agostinhos, separando-se de Castela.
A reforma da Ordem em Portugal começou em 1535. Segundo alguns autores, este foi o período de esplendor da Ordem dos Eremitas Agostinhos, com a fundação de numerosos conventos em Portugal e nas terras de missionação.
Em Santarém, data de 1373 a licença do Papa Gregório XI (1330-1378) para a fundação de um Convento nesta cidade: Houverão licença do S. Padre Gregorio XI em Breve dado em Avinhão no anno de 1373, 3º do seu Pontificado, e d’El Rey D. Fernando e do Bispo de Lisboa D. Agapito Colona (1).
Em 1376, os agostinhos fixaram-se na cidade, sob o patrocínio dos Condes de Ourém – D. Afonso Teles de Meneses e sua mulher D. Guiomar de Vilalobos. Fundaram o convento de Santo Agostinho, inicialmente nas casas cedidas pelos Condes de Ourém. Principiou em seus Paços e Casas que logo cederão para este effeito; n’huma das salas, das quaes, fizerão os Religiosos Igreja, e do restante do Palacio, que repartirão em aposentos à maneira de Cellas, convento, em quanto a edificação do convento não chegava a estado de os poder acommodar regularmente (1), sendo Frei João Torres vigário geral da Província e Frei Lourenço de São Tiago o primeiro Prior. A primeira pedra do novo convento foi lançada no dia 12 de Maio de 1376.
Entre 1408 e 1412 foi prior do convento de Santarém São Gonçalo de lagos, que iniciou as grandes obras de acabamento e aperfeiçoamento do edifício, fazendo prosperar de tal modo o convento, ao ponto de ser considerado aquele onde a Regra tinha a sua maior observância. Realizou para o convento de Santarém um especial Livro de Coro: entretinha as horas vagas em escrever Livros de Cantochão para o Coro, no que foi eminente pela formusura dos caracteres e das notas da solfa. Existião destes, em pergaminho, dous, hum no Convento da Graça, e outro em Santarém (2).
No convento de Santarém realizou-se a 26 de Outubro de 1571, a importante Congregação Intermédia, com intervenção directa del Rei D. Sebastião (1554-1578), onde se determinou a fundação de conventos agostinhos nas partes da Índia. Em 1572 embarcaram os primeiros missionários para o Oriente, atingindo terras tão longínquas como a Pérsia, a Geórgia, o Paquistão, a Rússia, além das terras do Congo e Mina e da costa oriental de África.
As relações deste convento com o oriente são muitas e variadas. Por aqui passou o notável Frei D. Aleixo de Meneses, prior de Santarém entre 1590 e 1592, e posteriormente Arcebispo de Goa, e aqui professou em 1598, o venerável Frei Guilherme de Santo Agostinho, falecido em 1612 na Arménia.
O convento possuía uma notável Biblioteca, segundo o Catálogo de Livraria do Convento de Santo Agostinho de Santarém - Index Librariae Conventus S. P. N. Augustini Schalabitanenssis In quatuor divisus partes - actualmente na Biblioteca Nacional. Desta preciosa livraria, é referida numa nota de 1834 - He da Livraria de N. P.e S.to Ag.º de Santarém (5).
A Ordem Agostiniana, com grandes santos e numerosos mártires, desenvolveu uma importante actividade no campo do ensino e da cultura, através de prestigiosos colégios e grandes bibliotecas.
Entre os agostinhos de Santarém, destacaram-se pelas suas obras: Frei Gaspar do Casal (1510-1584), arcebispo do Funchal e notável pela sua participação no Concílio de Trento; Frei António da Piedade (1675-1731), autor de várias obras de apologética; Frei António de São Vicente, missionário no Gorgistão (c. 1630); Frei Carlos da Mota (1670), insigne mestre de Teologia; ou falecidos com fama de santidade: Frei Martinho de Santarém (†1483), Frei Gaspar das Chagas (†1586); o Venerável Frei Guilherme de Santo Agostinho (†1612), e tantos outros…
Após a extinção das ordens religiosas em 1834, a maior parte das casas dos agostinhos foi destinada a outros usos, como em Santarém. A Ordem foi restaurada em Portugal no final do século XX.
Os religiosos vestem hábito negro com o característico cinto, também negro.
Aos Agostinhos estão associadas práticas devocionais muito antigas. Em Santarém, a memória da devoção a Santos da Ordem, permaneceu nas invocações de Santos agostinhos, como São Nicolau Tolentino e Santa Rita de Cássia, em duas das capelas da igreja da Graça; e a procissão do Senhor dos Passos, com capela própria na igreja e associada à antiga Irmandade dos Passos, eventualmente com origem no convento da Graça de Lisboa.
A Ordem, actualmente chamada Ordem de Santo Agostinho (OSA), tem no escudo os símbolos do grande santo: um coração em chamas (expressão do amor de Agostinho a Deus), uma seta (expressão do amor de Deus) e um livro aberto (representando a Palavra de Deus).
A igreja da Graça de Santarém é um precioso testemunho da vida dos religiosos agostinhos, muitos deles desconhecidos, que se lançaram na evangelização de terras muito longínquas. Tem também um património notável pelo entrecruzamento da história de três continentes com figuras de navegadores, governadores e homens de armas de grande projecção em terras de além-mar, nomeadamente Ceuta, Brasil, Cochim...
- AZEVEDO, Carlos Moreira, Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho em Portugal (1256-1834,) edição da Colecção de Memórias de Fr. Domingos Vieira, OESA, Lisboa, Universidade Católica Portuguesa, Centro de Estudos de História Religiosa (CEHR), 2011, p. 269.
- Idem, p. 390.
- VASCONCELOS, Padre Ignácio da Piedade - História de Santarém Edificada. Lisboa: s.n., 1740, vol. II, tomo I, p. 149.
- Igreja da Graça - Santarém. Boletim da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais. Lisboa: Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, 1951, n.º 65-66, p. 20.
- SILVA, Fernanda Maria Alves da Silva Guedes de campos, Bibliotecas de História aspectos da posse e uso dos livros em instituições religiosas de Lisboa nos finais do século XVIII (…), tese de doutoramento, Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 2013, Vol. 1, Tomo 1, p.201.
REFERÊNCIAS
- Igreja da Graça - Santarém. Boletim da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais. Lisboa: Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, 1951, n.º 65-66.
- PEREIRA, Paulo (dir.), História da Arte Portuguesa, Lisboa, Círculo de Leitores, 1995.
- ALONSO, Carlos, Os Agostinhos em Portugal, Madrid, Ediciones Religión Y Cultura, 2003.
- AZEVEDO, Carlos Moreira (Dir.), Ordem dos Eremitas de Santo Agostinho em Portugal (1256-1834,) edição da Colecção de Memórias de Fr. Domingos Vieira, OESA, Lisboa, Universidade Católica Portuguesa, Centro de Estudos de História Religiosa (CEHR), 2011.
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